Primeiro capítulo do romance-folhetim
Este é um dos três que liberarei gratuitamente. Lançar uma versão paga da news é um passo importante, mas o conteúdo que você já recebe (novidades, eventos, bastidores) continuará gratuito pra sempre!
A edição da newsletter de hoje é um grande passo pra mim, e estava morrendo de ansiedade pra compartihar esse momento com você! Vai ser incrível receber feedback enquanto a história está sendo publicada, algo que nunca tentei antes.
Se você não tem ideia do que estou falando, há um tempinho penso em lançar um romance-folhetim num formato de assinatura com conteúdo pago exclusivo. Se você me acompanha, já me viu comentar a respeito. Pra quem não conhece o conceito de folhetim, é uma publicação seriada, em que vou liberar um capítulo por vez.
Antes de mergulhar no primeiro capítulo, porém, queria explicar umas coisinhas.
O conteúdo que você já acompanha continuará gratuito. Prometi um conto extra na news? Gratuito. Espiadinhas no andamento dos livros a serem publicados em formato tradicional? Gratuito. Anúncio dos meus eventos, pré-venda, capa? Gratuito. Pra sempre. É uma honra ter você por aqui comigo.
A versão paga está disponível e você pode assiná-la desde já. Mas até o capítulo 3, vou disponibilizar para todo mundo. A partir do quarto capítulo, só pros assinantes.
Os três primeiros capítulos serão enviados com um intervalo entre uma semana e dez dias, dependendo da taxa de abertura de cada e-mail. Ou seja, quanto mais gente ler, mais rápido vai o próximo :D
A partir do capítulo 4, a publicação do folhetim será mensal, mas isso deve mudar conforme o número de assinantes (logo baixo explico melhor!).
Optei pelo valor mensal de R$ 9,90, como amigues no Substack, para ficar acessível e sobrar pelo menos um euro pra mim.
Sei que um capítulo por mês vai criar uma ansiedadezinha por mais, então criei metas, no estilo campanhas de assinatura recorrente de sites como Catarse e Apoia-se. Adoraria sua opinião sobre o que mais eu poderia acrescentar a essas metas!
EXCLUSIVO PARA AS 20 QUE ASSINAREM PRIMEIRO: um bate-papo via meet, a ser marcado quando atingirmos esse número. Vamos conversar sobre o romance-folhetim, além de curiosidades sobre outros projetos/ publicações.
30 assinantes: acréscimo de desenhos simples, feitos por mim mesma, sem nenhum uso de AI), com elementos da narrativa (tem um exemplo no capítulo de hoje, mas só teremos outros quando atingirmos essa meta!);
50 assinantes: a periodicidade do envio dos capítulos passa para uma vez a cada três semanas;
80 assinantes: curso online de 2h sobre bruxas (envolvendo minha pesquisa acadêmica do doutorado e a atual, sobre bruxas na história x bruxas na ficção);
100 assinantes: gravação dos capítulos em voz alta pelo Substack;
120 assinantes: a periodicidade do envio dos capítulos vira quinzenal.
Aceito sugestões!
Dito isso, chegou o momento de você conhecer meu novo universo. Li o começo de uma primeira versão deste capítulo na live de lançamento de Senciente Nível 5 em 2020. Se você estava lá, vai reconhecer a situação e a dupla protagonista.
Embora eu já tenha uma boa porcentagem do livro escrita e o Porém Bruno tenha me ajudado a editá-los, lembre que esta é uma história em andamento. Assim, você vai acompanhar também meu processo criativo (que devo comentar num parágrafo rapidinho após o final de cada capítulo), tipo alguns dilemas que me surgiram e por que fiz certas escolhas.
Ainda não consegui decidir o título… Outra hora explico por quê.
CHEGOU O MOMENTO.
Jogaram o homem no chão como um saco de batatas e ele ficou caído ali, de bruços, parecendo um cadáver. Claro, se fosse um, não teriam se dado ao trabalho de atirá-lo numa masmorra suja. Encolhi-me mais contra a parede, sob a sombra, de modo a escapar dos últimos raios de sol na janela diminuta, longe da treliça avermelhada que formavam no chão de pedra.
Os pernilongos já zumbiam, prontos para perturbar meu sono com seu apetite insaciável. O mar quebrava na praia ao longe. O vento oceânico soprava morno, contribuindo para abafar a atmosfera ainda mais. Meu suor não conseguia evaporar com a espessa umidade do ar e o resultado disso era eu acabar grudenta, com os cabelos ensebados.
Uma tosse sofrida, seguida de uma respiração ruidosa, anunciou o despertar do recém-chegado. Sua voz devia ter um timbre grave, a julgar pelo pouco que se revelava naqueles sons. Ele gemeu e tossiu de novo. Provavelmente quebrara algumas costelas. Seu ofegar entrecortado indicava que um osso incomodava um pulmão, talvez de modo perigoso. Não que fosse problema meu.
Abanei a mão perto da orelha direita para afastar o mosquito zumbindo quase no meu cérebro. O homem estremeceu e, plantando as duas mãos compridas e magras no chão, tentou se erguer. Não funcionou. Sua camisa era de um tecido leve e decerto caro, e o branco parecia ter sido imaculado antes das manchas de sangue que ora o adornavam. O mesmo se poderia dizer do tecido de suas calças pretas de linho, sem dúvida novíssimas. Quem quer que fosse, era de origem abastada. Qual seria seu crime, para ir parar na masmorra, dividindo cativeiro comigo?
Fora algo recente. Seus cabelos negros estavam limpos, e eram finos e lisos demais para durar assim na prisão. Ou seja, havia sido detido naquele dia mesmo. Os nós dos dedos apresentavam hematomas, portanto ele tinha socado alguém. Suas mãos não eram, entretanto, as de alguém acostumado a brigar fazendo uso dos punhos — nem executar trabalhos braçais, aliás.
Sacudi a mão outra vez para afastar novo mosquito, querendo bufar de ódio das pragas, mas segurando o som a fim de não chamar a atenção do homem. Ele prendeu a respiração e voltou a tentar se levantar, outra vez sem sucesso. Acaso me ouvia? Observei-o melhor. Sem enxergar seu rosto, era difícil precisar, mas ele parecia atento ao entorno.
Murmurou algo ininteligível. Sim, voz grave. Voltei a observar-lhe as mãos. Pertenciam a um homem jovem. Havia uma mancha já velha de tinta no polegar e indicador esquerdos. Canhoto. Letrado. Se fosse um de nós, eu já o teria reconhecido. Alto escalão do governo, então. Interessante. O que fizera, para ir parar ali naquele estado?
Um pernilongo pousou na minha perna e o matei com um tapa por puro reflexo. Merda. Os músculos dele retesaram-se a olhos vistos.
— Q-quem está aí? — veio a voz rouca, cheia de incerteza. Uma tosse seguiu-se, sofrida.
Merda. Se eu respondesse, ele saberia estar na companhia de uma mulher. Não que estivesse em condições de fazer alguma coisa, mas homens acuados viravam animais. Especialmente sendo alguém acostumado ao poder — desejaria exercer o mínimo que lhe restava naquelas condições deploráveis, se lhe fosse dada oportunidade para tanto.
Ele inspirou fundo, apoiou as mãos no chão e forçou-se a erguer o tronco e a cabeça, apenas um pouco, de modo a olhar diretamente para mim. Era bonito. Ou devia ser, se o rosto não estivesse inchado e sujo de sangue. O nariz parecia quebrado, mas os olhos verdes eram lindos, sem discussão.
— Desculpe — ele conseguiu dizer. — Entendo por que você não respondeu. — Tossiu, largando-se no chão, onde ficou arfando. O som de sua respiração tornou-se ainda mais arranhado. — Tive medo. Não se preocupe. Não a perturbarei.
Renovado acesso de tosse o acometeu. Ele gemia de dor a cada pausa para respirar e a tosse tornava-se mais cruel depois. Cada frase deixava-o ofegante. Ele morreria se continuasse assim, e então viriam moscas e ratos. Sabia-se lá quando retirariam seu corpo de lá. E eu só sairia dali para outro interrogatório, ou então finalmente para a execução.
Arrastando-me sobre os joelhos, alcancei-o e pousei uma mão em suas costas. A camisa estava empapada de suor, além das manchas de sangue. Ele se retesou, inspirando rápido no susto, e começou a tossir de novo.
— Shh — murmurei. Tateei as linhas dos ossos à procura de fraturas. Cada toque arrancava-lhe gemidos que ele claramente não conseguia conter. — Nada quebrado por aqui. Vou te ajudar a virar. Se você fizer algo impróprio, vou te abandonar à própria sorte.
— Obrigado — ele arquejou.
Com meia dúzia de movimentos precisos — e instruções obedecidas —, consegui colocá-lo de barriga para cima. Ele segurou os grunhidos, travando o maxilar com força. Passei a examiná-lo, não só seu peito como também suas caretas de dor e sons de desconforto. Quando rocei uma costela, ele urrou.
— Quebrada — declarei, sem me abalar. — Aguente mais um pouco para eu ver se é só essa.
Ao menos ele ficou quieto e deixou-me prosseguir, engolindo em seco várias vezes. Era um daqueles homens com o pomo de Adão pronunciado, e reparar nisso levou-me a ver as marcas de enforcamento em seu pescoço, feitas por uma corda ou algo igualmente capaz de causar lacerações por atrito com a pele. Não à toa ele respirava com tanta dificuldade.
— Que bela surra você tomou — comentei. — Roubou o tesouro imperial, foi?
— Seria melhor se sim — ofegou. — Pelo menos eu teria alguma esperança de sair daqui subornando alguém.
Eu queria perguntar o motivo de ele estar ali, mas isso o convidaria a fazer o mesmo. Depois de conseguir evitar falar de mim até para os interrogadores mais rigorosos, não abriria a boca com um completo desconhecido.
— Melhor você ficar sentado para não pressionar — eu disse. — Vai cicatrizar errado de qualquer jeito, se você passar tempo demais aqui, mas pelo menos sua costela não vai perfurar o pulmão.
Um suspiro. Ele apoiou as mãos no chão para impulsionar o tronco. Precisei contê-lo. Levantar assim era convidar a morte. Parei ao lado de sua cabeça, icei-o pelos ombros e arrastei-o com cuidado até a parede. Ele se escorou. O som de sua respiração melhorou de imediato.
— Obrigado. Qual é o seu nome?
— Sofia. E o seu?
Seus olhos arregalaram-se em reconhecimento, mas ele voltou à expressão anterior tão rápido que eu poderia ter imaginado. Se eu não fosse especialista em identificar essas pequenas nuances no rosto das pessoas, com certeza não teria pensado duas vezes no assunto.
— Gabriel.
Ele desviou o olhar, suspirando. O som saiu menos doído dessa vez. Acaso estaria pensando no status perdido? Ou no que o levara até ali? A curiosidade não me deixava em paz. Desde a minha prisão não acontecia nada tão diferente.
Devagar, Gabriel tateou as costelas, como eu havia feito. Eu sabia quando ele tocava um ponto sensível por causa da respiração de repente sibilada entre os dentes. Ele esticou as pernas compridas e cruzou-as nos calcanhares, ajeitando as costas o mais retas possível contra a parede.
— Que horas costumam trazer as refeições? — perguntou, depois de um tempo.
— Em algum momento depois do crepúsculo, então daqui a pouco. E também logo depois da alvorada.
— Sem almoço?
— Se estiver calor, trazem água perto do meio-dia — expliquei. — Isso se não andarem putos…
Um vinco surgiu entre suas sobrancelhas, mas Gabriel não pediu esclarecimento algum, então continuei quieta. Bem, os carcereiros ficavam putos comigo por continuar alegando não saber de nada. Ele ficaria sem a água do almoço por minha causa, ou eu por causa dele? Difícil dizer. Quando desviei o olhar, avistei o penico no canto. Ai, que mal-estar só de imaginar…
Abanei a mão contra o zumbido irritante. Logo estaríamos no escuro, à mercê dos insetos. Já havia aparecido até uma sucuri uma vez. Foi só ficar quieta no meu canto e ela não me incomodou — embora ainda me perguntasse como a criatura conseguira passar pela janelinha gradeada.
Minha atenção retornou ao recém-chegado, que fitava o penico com ar de dignidade ferida. Olhou-me de relance e então fixou-se na janela. Não comentou. Ficamos em silêncio até ouvir as chaves na porta.
Entrou primeiro um soldado armado, que lançou um olhar de desculpas a Gabriel antes de mirar em mim. Em seguida, duas empregadas com bandejas, uma para mim e outra para ele. Para minha surpresa, apareceu ainda uma terceira mulher, carregando um balde de água e uma bolsa.
— Boa noite, Excelência — sussurrou esta, entregando-lhe uma carta. Ele leu depressa, quase com avidez, franzindo a testa três ou quatro vezes, antes de assentir e lhe devolver o papel.
A mulher ajudou-o a afastar-se da parede e tirou-lhe a camisa com cuidado. Imensos, os hematomas preto-arroxeados em seu peito pálido explicavam os gemidos a cada mínimo contato. Eram mais de dez, desciam sob o cós da calça a perder de vista; multiplicavam-se pelos braços. Os pulsos apresentavam os mesmos sinais de terem sido amarrados a corda que o pescoço.
Eu comia devagar e observava-a tratá-lo, primeiro limpando o sangue de seu rosto e torso, depois passando remédio nos machucados e hematomas, para em seguida dar atenção às feridas faciais, principalmente ao nariz quebrado. Acabei de comer e a empregada partiu com minha bandeja, e a terceira mulher continuou a tratar Gabriel com silenciosa diligência.
Quando enfim acabou, ela lhe deu uma camisa nova limpinha e retirou-se com sua bolsa e o balde. Gabriel bebeu sua água e comeu um pouco, mas guardou a goiaba e a banana para depois, sem muito interesse. Invejei-o. Não me lembrava de como era não sentir fome. A última empregada levou a bandeja; o soldado recuou até a porta, mirando em mim o tempo inteiro. E foi embora também, trancando a porta com um estardalhaço. Havia apenas uma réstia de luz, àquela altura. Gabriel estendeu-me as frutas numa só mão.
— Pegue.
Meu estômago contraiu-se. Não queria dever favores a alguém a quem chamavam de Excelência.
— Você não quer? — murmurei.
— Não faço questão. E você parece faminta.
Ainda assim, hesitei.
— Você pode ter fome mais tarde…
— Pegue logo, Sofia. Não gosto de dever favores, menos ainda a desconhecidos.
Ah, se era assim, então ótimo. Avancei até ele e apanhei-as, agradecendo. Devorei a banana ainda em pé e atirei a casca para o mais longe possível, pela janela. Senão os restos atrairiam bichos. Sentei-me no lugar de antes e comi a goiaba devagar, tentando saboreá-la. Eu nunca recebia frutas. A variedade na dieta caiu bem.
Ele pigarreou.
— De quanto em quanto tempo… hã… eles vêm tirar…? — Gesticulou vagamente na direção do penico.
— Todo dia de manhã, quando trazem a comida. — Ante seu olhar horrorizado, acrescentei: — Não a mesma pessoa.
A informação não melhorou sua expressão. Ele olhava para lá e para mim, indeciso. Céus, que ele só precisasse mijar. Não estava preparada para tolerar mais nada. Pior de tudo: já havia urina minha ali. Se eu tentasse arrastar o maldito penico com o pé, com certeza respingaria no chão. E não tocaria naquilo. Então ele teria de se locomover até lá. Naquele estado.
No fim, Gabriel ergueu-se sozinho, primeiro sobre os joelhos. Sabia equilibrar o corpo de modo a pôr toda a força nas pernas, mal movendo o tronco. Era um homem alto e longilíneo, cujos movimentos rígidos de dor ainda assim traíam a leveza aristocrática de quem nunca se preocupara se teria o que comer no dia seguinte.
De costas para mim, devia ter aberto só os botões da calça para urinar. Uma vantagem majoritariamente masculina. Depois voltou ao seu lugar, esfregando uma mão na calça com ar de nojo. É, amigo, sem água para lavar a mão. E vai piorar, viu?
— Há… há quanto tempo você está aqui? — perguntou, exasperado.
— Mais de cinco semanas, mas perdi as contas.
Ele torceu o nariz com tamanha cara de nojo que só me encolhi. E não se dirigiu mais a mim naquela noite.
Disclaimer: prometo não abandonar os dois nessa situação de imundície, nem tacar cena caliente estilo Dark.
Disclaimer 2: estou aprendendo a desenhar e treinando, então ainda não posso prometer uma arte oficial do ship, mas um dia vem aí.
Qual você acha que é o gênero dessa história? 😇 Sério, me responde. Estou curiosa pra saber se alguém vai adivinhar (ou se lembrar hehe)!
Até semana que vem o//
Meus palpites baseados nos indícios que captei (vozes da minha cabeça): Sofia é bruxa, Gabriel é um aristocrata rebelde, o livro será uma "romantasia histórica", com pitadas de O Conde de Monte Cristo, Os Miseráveis, e claro, Piratas do Caribe.
Senti uma vibe meio Will Turner e Elizabeth Swann, mas devo ter passado longe nesse chute. hehehe
Eu amei tanto esse início.
A pior parte agora é ter que esperar a continuação sair.