Capítulo 2 do romance-folhetim
Este é o segundo dentre os três capítulos que publicarei gratuitamente na newsletter. Será que com as pistas de hoje você descobre qual é o gênero do livro?
A publicação do primeiro capítulo, na semana passada, me causou bastante ansiedade. Eu não fazia ideia de como os leitores reagiriam a uma história sem título e sem gênero divulgados, ainda incompleta.
Mas EIS QUE recebi as melhores reações do mundo, que saíram de uma empolgação inicial pra altas teorias da conspiração! Então, se você comentou aqui no Substack ou participou ativamente do meu grupo ligado ao canal do Telegram, muito obrigada! Foi maravilhoso ver a quais tipos de detalhes o pessoal se apegou, quais deixaram passar, o que chamou a atenção de todo mundo e no que só uma ou outra pessoa reparou. Uma das melhores partes de publicar um romance nesse formato seriado é, sem sombra de dúvida, ter feedback em tempo real.
Só lamento não poder falar demais durante as dicussões do Telegram, exceto reagir com emojis misteriosos hahaha Mas é que sou tagarela e, se deixar, entrego tudo. Como diz um áudio que já foi trend gringa no Tiktok, eu queria ser a garota calada e misteriosa, mas sempre tenho algo a dizer! :’(
Ainda não está no grupo? E só entrar aqui!
Uma das questões mais discutidas, que poderia ajudar a identificar o gênero do livro em algum nível, foi a calça de linho do Gabriel. A Hortencia fez até um espectro!
Eu não estava esperando chegar tão rápido aos 20 assinantes estipulados pra live exclusiva (se você está nesse grupo, receberá um e-mail logo na primeira semana do ano!), menos ainda bater a meta inicial de 30 assinantes antes da publicação do segundo capítulo. Meus desenhos demoram; nada vem fácil ou natural justamente porque ainda estou construindo o hábito, acostumando os músculos do braço e a cabeça a fazerem o que eu quero, então fiquei feliz e levemente desesperada. Passei o Natal desenhando, e foi um presente especial.
Gostaria de agradecer às trinta pessoas que contribuíram pra todo mundo receber este capítulo ilustrado. Perguntei no canal do Telegram se alguém preferia não ter o nome mencionado, mas não quero usar o silêncio como permissão, então cito aqui apenas quem se manifestou positivamente: Camila Brito, Carol Sena, Carolina Brunner, Caroll Alex, Chrys Flohr, Débora Reis, Fernanda Costa, Hortecia Alves, Lisandra Costa, Mariana Paixão, Mialle, Parker Coimbra, Raphael Wandermur e Thamara Reis. Além dessas, outras pessoas tornaram possível eu separar dias inteiros pra produzir desenhos, então muito carinho e gratidão a todas! Se seu nome não consta nessa lista e você gostaria que sim, responda este e-mail ou me mande mensagem, que eu atualizo no Substack.
A próxima meta é chegar a 50 assinantes, momento em que a postagem dos capítulos (a partir do 4º) passará de mensal para um a cada três semanas. Relembrando quais são as metas:
EXCLUSIVO PARA AS 20 PESSOAS QUE ASSINAREM PRIMEIRO:um bate-papo via meet, a ser marcado quando atingirmos esse número. Vamos conversar sobre o romance-folhetim, além de curiosidades sobre outros projetos/ publicações.30 assinantes:acréscimo de desenhos simples, feitos por mim mesma,sem nenhum uso de AI), com elementos da narrativa (tem um exemplo no capítulo de hoje, mas só teremos outros quando atingirmos essa meta!);50 assinantes: a periodicidade do envio dos capítulos passa para uma vez a cada três semanas;
80 assinantes: curso online de 2h sobre bruxas (envolvendo minha pesquisa acadêmica do doutorado e a atual, sobre bruxas na história x bruxas na ficção);
100 assinantes: gravação dos capítulos em voz alta pelo Substack;
120 assinantes: a periodicidade do envio dos capítulos vira quinzenal.
Pra gente alcançar a próxima faixa mais rápido, que tal você divulgar pros seus amigos e familiares que podem se interessar?
Algumas pessoas me perguntaram se não existem faixas mais altas de preço, pois gostariam de me apoiar com um valor maior. Como o Substack não oferece essa possibilidade, estou cogitando abrir uma assinatura num site de financiamento coletivo pra oferecer cursos livres, que também permitiria me apoiar só pela bondade do seu coração haha <3 Você se interessaria? De qual tipo de curso gostaria? Lembrando que já previ o da meta de 80 assinantes.
Existe também uma modalidade de apoio aqui no Substack que é a do membro fundador. Para ela, a contribuição é maior do que o valor anual, se você tiver interesse. O problema, tanto dessa modalidade quanto da anual, é que não existe a possibilidade de parcelamento, então considere o que seu orçamento permite.
Se você quiser me apoiar financeiramente, mas não puder contribuir com um valor muito maior, considere dar uma assinatura de presente pra alguém que você acha que pode gostar do livro (mas por favor avise a pessoa e confirme se ela quer, senão a taxa de aberturas do e-mail pode cair e isso me prejudica).
Antes do capítulo 2, vamos recapitular o que aconteceu no 1!
Conhecemos Sofia, que está presa há um tempão numa cela pequena, quente e cheia de mosquitos, e Gabriel, que foi largado lá todo machucado depois de tomar uma surra. Sofia o observou, ressabiada, e acabou o ajudando, temendo que, se ele morresse, o cadáver atraísse ratos. Mas, afinal, o moço recebeu privilégios na forma de comida a mais, água pra se limpar e cuidados médicos. QUEM É ELE, meu deus? Aliás, quem é Sofia? O que eles fizeram pra ir parar ali? E onde fica essa cela?
Tantas perguntas…
Será que o novo capítulo responde algumas?
Fiz xixi antes de amanhecer, após uma noite péssima na qual os mosquitos não me deixaram dormir de novo. Acordei toda picada e de mau humor. Gabriel só despertou com o barulho da chave na porta, pelo menos uma hora depois. Dormira de barriga para cima, uma posição impossível para mim, especialmente no chão de pedra. O soldado armado era outro, mas as empregadas eram as mesmas: duas trazendo a nossa refeição e uma, um balde de água e sabão.
Esta última refez os curativos e deixou-o lavar-se, entregando-lhe um pano para isso. Gabriel só não tirou as roupas de baixo, mas lavou até o que elas escondiam. Só vi pela visão periférica, claro. Seria constrangedor ficar olhando. Além disso, estava ocupada comendo (e morrendo de inveja). Devia ser bom ter importância a ponto de receber aqueles cuidados. Sua refeição outra vez era melhor do que o minha, e ainda tinha ganhado uma tigela com uma manga cortada em fatias, uma goiaba e jabuticabas, além do prato igual ao meu, com um ovo cozido, cenoura em tiras e um pãozinho. O que eu não daria por uma única jabuticaba ou fatia de manga?
Quando Gabriel se sentou para comer, disse à mulher responsável por seus cuidados para deixar o balde, o pano que usara e mais outro, limpo. Para minha surpresa, ela anuiu. Ele quis ficar também com a tigela de frutas e, novamente, não houve objeções. Ao ficarmos a sós, ofereceu-me o pano não usado.
— Limpe as mãos ou você não vai chegar perto dessas frutas.
— Vejo que o senhor está acostumado a dar ordens e vê-las obedecidas, Excelência — resmunguei. — Eu me lavaria todo dia, se pudesse, então não tem necessidade de falar assim.
Lavei as mãos. Foi um alívio. Eu tinha sido preparada para aguentar quase qualquer aspecto de um cativeiro, no caso de um dia ser pega, mas não os ataques cotidianos à dignidade, aos poucos minando a sensação de ser uma pessoa.
— Coma o quanto quiser — disse, depois de pescar uma fatia de manga.
— Mau negócio para você — falei. — Por mim, comeria tudo.
— Então fique à vontade.
— Você vai ter fome durante o dia… — Queria tanto aquilo tudo! Mesmo assim, sentia-me na obrigação de avisar. — E eu não gosto de dever favores.
Ele sorriu de lado.
— Estou em melhores condições de oferecê-los e sei que você não pode fazer nada por mim, Sofia. Deixe de ser orgulhosa.
Peguei uma jabuticaba e a enfiei na boca.
— Por que você…? Já me deu suas frutas ontem…
— Gosto de estar vivo e isso talvez não fosse mais possível sem a sua atenção ontem. — Ele pegou uma jabuticaba. — Agora, por que você me ajudou continua um mistério.
— Curiosidade. — Peguei uma manga. Tão doce! Lembrava uma tarde em casa. — E um cadáver atrairia bichos.
Comemos. Ele deixou a goiaba inteira para mim. Segurei a tigela vazia, alimentando uma nova esperança.
— Hum… posso pegar um pouco de água para me lavar? — murmurei, mostrando a tigela.
— Eu já ia oferecer. Pode usar o balde. Trarão outro no jantar.
Sorri com a oferta, mas enchi a tigela mesmo assim.
— Para lavarmos as mãos — expliquei.
— Você é civilizada — comentou, dando-me as costas e virando-se para o canto. — De onde veio?
Levei o balde para o meu lado, apanhei o pano e despi a parte de cima. Limpei-me depressa, instantaneamente aliviada com o toque limpo da pele antes pegajosa. Não era o modo mais higiênico do mundo, mas melhor do que nada.
— Fui presa por estar na companhia de rebeldes — disse, com cautela.
Ele era alguém do governo, afinal. Bem poderia usar informações minhas para se promover, voltar às boas graças de seus pares e conseguir perdão para qualquer que fosse a merda que tivesse feito.
— Você é rebelde?
— Não, não sei de nada — respondi, no automático. — Nem sabia que eram rebeldes… E você?
Gabriel olhou para cima, suspirando.
— Irritei a imperadora.
Uau. Ele era uma pessoa com acesso à imperadora em pessoa. Não à toa recebia regalias na masmorra. Alguém assim devia ter aliados poderosos; não passaria muito tempo ali. Ainda bem que não abri o bico sobre minha identidade.
Mas por que alguém me voluntariaria uma informação dessas?
Terminando de me limpar, vesti a calça sem nada por baixo, lavei meu paninho e depois a calcinha e pendurei-os na janela. Até a hora do almoço estariam secos.
— Obrigada — sussurrei. — Estou quase me sentindo gente de novo.
Gabriel virou-se, recostando-se à parede. Sentei-me na oposta, de frente para ele.
— Engraçado — comentei. — Para a maioria das pessoas, ela é intocável, quase uma lenda.
— Ah, ela é bem tangível, isso eu garanto. Mimada. Por causa de um problema respiratório, mastiga de boca aberta. Vive com mania de perseguição. Tem a voz bonita, mas prefere falar em falsete por alguma razão incompreensível.
Que descrição absolutamente fantástica da imperadora — e tão pessoal!
— Você já… compartilhou a mesa dela?!
Desviando o olhar, Gabriel sorriu de lado.
— É tão bonitinho você não saber quem eu sou. Nunca tinha acontecido antes. Vou te deixar às escuras, só pela diversão.
Fiz uma careta, sem me dignar a responder. Ele inclinou a cabeça, agora me encarando.
— Você não quer saber? Nem mesmo como vim parar aqui?
— Lógico que sim. Você é uma quebra de rotina neste lugar horrível.
— Mas…?
— Reciprocidade. Eu não quero responder nada, então não pergunto.
Outro sorriso torto, um assentir.
— Justo. Mas já aviso que morrerei de tédio sem poder nem conversar, e então você terá o cadáver que não queria.
— Tudo bem. Agora que sei de sua importância, sei também que não vão deixar seu corpo aqui.
Ele soltou uma gargalhada. O movimento devia ter lhe causado dor; levou a mão à costela quebrada com uma careta. Eu me controlei para não sentir simpatia demais por aquela figura altiva e prostrada, mas bom humor era um bem raro na masmorra. E a companhia não desagradava, exceto quando inconveniente, claro. Como agora.
— Preciso fazer xixi — anunciei, sem preâmbulos.
Gabriel deu as costas sem discutir e começou a falar sem parar: do tempo, das saudades do mar, de sua única incursão à floresta, quando vira os mais lindos pássaros coloridos, a arara-azul, a arara-canindé e a arara-canga. Foi gentil de sua parte tagarelar daquele jeito. Só achei difícil me concentrar em agachar naquela situação ridícula e urinar, sabendo que ele poderia se virar a qualquer momento.
Lavei as mãos na água da tigelinha. Engraçado como uma coisa tão pequena podia fazer tanta diferença. Agradeci-lhe a cortesia de me dar a privacidade possível. Cogitei contar uma história em retribuição, uma das muitas do repertório da tia Margot, mãe do meu melhor amigo Felipe e a pessoa que me acolheu depois de meus pais serem assassinados pelo Império. Eu só deveria tomar o cuidado de escolher uma que não revelasse minha criação entre os rebelados.
Meus planos foram interrompidos pelas chaves na porta. Ouvi o som como uma sentença; ainda não era nem metade da manhã. A única explicação para aquela visita era eu. Vinham me buscar para mais um interrogatório. O olhar de Gabriel encontrou o meu, o vinco entre suas sobrancelhas logo desfeito num ar de compreensão. Acaso meu semblante estava tão assustado assim?
Enrijeci ao abrirem a porta. Um de meus interrogadores habituais e dois soldados entraram. O primeiro sorria, quase feliz.
— Sofia, querida! — cumprimentou como se nos encontrássemos num salão de bailes. — Finalmente chegou o dia.
Apertei os lábios numa linha fina para não pedir esclarecimentos. O cretino sorriu mais, mostrando os dentes manchados de café e tabaco. Os soldados ergueram-me do chão com a truculência habitual.
— Não quer saber qual dia é?
— Por mim, foda-se.
Ele desferiu um tapa com as costas da mão. Vi estrelas em todo lugar e sombras na periferia do meu campo de visão.
— Hoje é o dia em que você vai falar, sua imunda.
Gabriel disse algo, mas o zumbido nas minhas orelhas não me permitiu escutar. Os soldados arrastaram-me para fora, cambaleante. Só escutei a resposta irônica do interrogador, eivada de veneno e falsa candura:
— Você não tem mais jurisdição aqui, Excelência. Apodreça.
E trancou a porta metálica com um baque que ecoou na masmorra inteira.
ECA, sabe? Dá uma água corrente pra esse povo, pelo amor de Deus!
Uma vez li uma fanfic que se passava com as duas personagens — que já se conheciam havia anos e até então tinham uma relação profissional — se apaixonando numa cela ao longo de 24 horas. Sabe aquelas fanfics tão boas que mudam alguma coisa em você? Foi uma dessas.
Mas eu gosto de pensar nas coisas até as últimas consequências (como você já deve ter percebido pelo modo como desenvolvi as discussões em torno dos poderes telepáticos de alguns bruxos em Porém Bruxa, por exemplo. Se ainda não leu, fica o convite!). E daí isso ficou na minha cabeça: em 24 horas, ok. E quanto a um período maior, talvez muito maior? A maioria dos livros que já li nos quais as pessoas passam muito tempo presas em condições desumanas até falam da falta de higiene, embora quase todos se centrassem nos aspectos de perigo mais imediato, por exemplo a tortura e/ou a violência sexual. Quando o muito drástico aparece, a gente tende a desconsiderar o mais “leve”. Mas já parou pra pensar o que é ser privado do que hoje consideramos algo básico? Água corrente, acesso a produtos de higiene, saneamento. E pensar que tanto gente no mundo vive em condições assim o tempo todo…
Por isso tentei imaginar cada desconforto no qual a gente até pensa quando lê, cada indignidade, e viver na pele dessas personagens como às vezes os livros evitam mostrar, porque é horrível e não causa um impacto super imediato.
Mudando de assunto, agora ganhamos mais elementos capazes de identificar o gênero do livro. O que te chamou a atenção? Sua opinião se mantém a mesma de antes ou agora você mudou de ideia? Comente aqui (me ajuda muito receber interações direto no Substack, e é uma forma gratuita de apoiar meu trabalho!) e, pra aprofundar as discussões com o pessoal, te convido a participar do meu Telegram! Está divertido, sem overposting, e eu comento sempre que posso, ou deixo reações misteriosas ainda não decifradas he he he
Será que batemos 50 assinantes antes do terceiro capítulo? Vou preparar uma surpresinha especial se sim :D
Até semana que vem!
Oh Excelência engraçadinho, custa contar pra Sofia quem você é?!?! Ela pode não querer a resposta mas eu quero!!!
Depois de ler os comentários de todo mundo aqui e no telegram me veio uma idéia muito louca. E se esse não for uma versão alternativa do Brasil império do passado, mas sim um distópico Brasil imperial do futuro?
Evidências:
Brasil: araras, manga e jabuticaba
Distópico: luta de um império vs rebeldes
Futuro: mulher de calças e aquele desenho de uma calcinha que vc super encontra na Americanas